segunda-feira, 30 de junho de 2014

[Contos de Josephine] Ela chorou devagar... em mais um de seus pesadelos.

Um susto. Acordar, abrir os olhos e não saber quem é.
Naquela tarde, foi um susto que a trouxe de volta. Respirar fundo e procurar o significado do simples fato de estar ali naquela cama desconhecida, com aquela cortina desconhecida.
Mas qual era a cama conhecida? Ela não conseguia se recordar.
Qual era a cortina familiar? Não lhe vinha a memória.

Terror, pânico, dor e ausência de si mesmo. De repente saber que você não sabe tudo que você foi até hoje, não saber exatamente o que um outro você planejou para o seu próprio futuro.

Ela chorou devagar. Chorou por alguns minutos e resolveu iniciar um processo investigatório.
A cor da cama, a cor dos lençóis ... o cheiro do travesseiro. Três travesseiros. Quem sou eu - Ela pensava aflita. Quem sou eu que dorme com três travesseiros.
Os armários, a casa vazia... as janelas abertas. Era necessário entender através do mundo de fora o que ela era, tinha sido e o que pretendia ser.

Foram aproximadamente três horas ... e ela chegou a uma conclusão.

Sou alguém, sou alguém que viveu, que vive e que viverá.
Sou alguém que bagunça e não se importa com isso. Sou alguém com porta retratos e louça na pia.
Sou alguém que tem um lar e janelas abertas. Sou alguém que coleciona pedras e tintas.
Sou alguém que deixou no aparelho um DVD de "Primavera, Verão, Outono, Inverno ... e Primavera"
Sou alguém com bolsa social, bolsa de inverno, bolsa de viagem pronta.

Sou alguém feliz, e existi de fato até esse instante, mas agora morri sem lembrar quem eu sou.

Um susto grande, falta de ar, acordar e abrir os olhos. O suor e as lágrimas se misturaram no rosto.
Tudo conhecido ao seu redor, Josephine tinha tido outro de seus pesadelos.


Ass. Amigo de Josephine


segunda-feira, 16 de junho de 2014

O melhor de mim, no meu melhor e mais bonito poema.


Eu vi um filme, conheci uma música e simplesmente tive um momento único na vida. Onde você simplesmente percebe. É aquele momento que você jamais poderá explicar pra alguém. Através desta música eu fiz o melhor poema da minha vida. É o que mais gosto, é o que mais eu fui realmente Tatiane, em todos meus valores e concepções. 

Esperei alguns meses, talvez mais de um ano ... o dia certo para mostrá-lo ao mundo. E hoje, através de um reconhecimento simples .. através de um olhar especial que me VIU de verdade ... entendi que era isso que eu precisava. Em um próximo post eu falarei sobre reconhecimento. Neste, eu serei somente eu.

Se eu puder aconselhar ... e conselhos são tão vazios ... eu falaria, leia sim, leia ouvindo a música. Não leia com os olhos, pois não escrevi com os dedos ... leia com a alma, leia inteiro, leia entregue ... sou EU.
E obrigada pela atenção. A de ontem, a de hoje e a de amanhã.




"É".

Quando tudo se conecta e você vê sentido ...
Quando tudo se absorve .. e você entende os motivos ...
Quando tudo acontece e é possível ligar antes e depois ...

O sentimento é alto , claro , solto ..
As cores se misturam e deixam si mesmas ...
Percorrendo o alto o baixo como se fossem apenas o meio ...
O dia e a noite são apenas crepúsculo...

O sorriso é tão profundo que se transfere aos órgãos...
Aquilo que está dentro percorre numa velocidade incapaz de ser vista
Incapaz de ser nomeada ...
Tudo que deveria ser dito já não deve mais ...

Não existe nome, não existe som .. não existem cores ...
Quando o universo inteiro parece ter entrado em você na sua inspiração ...
Quando a expiração leva de volta tudo que você não havia compreendido até então ...

As lágrimas já não possuem vez ... elas são você...
Tudo que você foi .. tudo que você será , tudo que você é ....
Quando a maior compreensão da sua vida surge e te mostra ..
Que jamais existirá a maior compreensão da sua vida ...

Quando o ar que percorre seus pulmões ..
passa contar a história de toda a humanidade ...
Quando seu olhar deixa de dizer algo ...
Quando seu olhar passa a ser simplesmente você completo...

Quando o medo que as vezes te buscava se transforma ...
E você passa a buscá-lo ... a ir ao encontro dele ...
Quando esse medo perde cores, cheiros, sensações ...
Quando você perde o medo de ter medo... e vocês se entendem ...

Quando a sensação de ser maior ou menor se esvai ...
E tudo vira a sensação de SER ... apenas ser ...
Quando os altos e baixos se amenizam ..
E o que se vê é chuva ...

Em todo momento que o planeta falaria baixo ao seu ouvido
E você jamais perceberia ... quando esse som se torna a única coisa a tocar seus ouvidos ..
Quando você compreende que o planeta lhe abraça .. clama ... e FALA ...
Quando você percebe que você é capaz de escutar ...

Os cheiros se harmonizam ... as identidades se abrem ...
A lágrima e o sorriso são o mesmo momento ..e a mesma razão ....
Nada existe onde tudo existe e você tem o entendimento que nada é e tudo é ...
É sopro ... é razão ... é antes e depois .. é pra sempre e nunca foi ...

Integração ... força ... sentido.

By Tatiane Batista

domingo, 1 de junho de 2014

[Contos da filha de um alcoólatra] A falta de alguma coisa que eu talvez nunca saiba o que é ...

Restou algo de alguém que você talvez nunca tenha sido ...
Restaram algumas coisas boas e outras tantas ruins. E as ruins prevalecem.

E eu me recordo de todas elas ...
A pior é saber que você mesmo não permitiu que restasse tempo para reaver e consertar o que você quebrou com o passar do tempo.

Eu já me despedi de você um tanto de vezes, por todos esses anos ... e .. em cada uma delas, eu me lembrei do tanto de vezes que por sua causa eu me despedi de mim mesma, da minha própria vida, como se aquele fosse mesmo meu instante derradeiro.

Eu simulei as batidas, simulei as quedas de precipício .. simulei cada movimento meu para sair de um veículo queimado, quebrado, em chamas, amassado, virado, arrebentado. E eu não deveria estar pensando nisso ...
certo? Crianças não precisam se preocupar com isso, certo? Crianças não devem precisar se despedir de si mesmas tão cedo...

Restaram dúvidas, perguntas a fazer, sonhos que você não poderá realizar.
Restaram brigas e decisões que eu queria ter tido com você.
E a agora, a cada vez que te vejo, que te olho, que te beijo, você parece não estar mais aí dentro.

Restaram também o Simply Red, Barry white, Rock, Forró e toda sorte de ecleticidade que fosse possível musicalmente em um ser humano.
Restou o carinho especial e a delicadeza sedutora. Restou a sedução severa ... a mágica da palavra e de ser o centro sem dificuldades.

Restou a argumentação e a sagacidade. Restou o instinto de sobrevivência.
Restou a certeza de saber que, quem você foi, nunca saberá quem eu me tornei, ou quem eu virei a me tornar.

Restaram as internações, as eternas discussões, restou indiferença.
Restou a luta pra não lidar com isso sozinha.
O que você deixou pelo caminho são cacos de todos nós e depois disso tudo, você sequer existe... e todos nós estamos tentando colar o que restou do queríamos ter sido.

Fomos promessas, potenciais. Somos hoje a luta para superar você. Cada um a seu modo, cada um com seu nível de dificuldade.

Restou a falta de alguma coisa que eu talvez nunca saiba o que é ...

T.S.

[Contos de Josephine] Sobre decidir partir ... decidir ficar. Sobre decidir acordar.

Ela chegou em casa e acendeu a luz...
A casa estava em silêncio, como deveria. A mesa estava arrumada, como deveria. O sofá em ordem, como deveria. Sua mente estava fora do tom, descompassada e torpe, como não deveria.

A vida tinha pregado mais uma de suas peças e lhe apresentado mais uma encruzilhada. Seria possível? Seria justo? Até quanto pode uma mulher tomar decisões consecutivas e que tem um impacto tão grande na humanidade?

Era necessário decidir entre partir ou ficar e tudo parecia tão incrivelmente simples que Josephine desconfiou de si mesma, desconfiou de sua convicção e de tudo que tinha acreditado até então. Era possível existir algo que a tivesse tirado do prumo e de repente suas certezas não estivessem assim tão sólidas.

Foi nesse momento de luz, em que as alternativas não estavam tão claras, que ela resolveu iniciar um processo que sempre é companheiro de boas decisões: preparar um lanche. Enquanto preparava um sanduíche light de pão integral com minas e peito de peru recheado de óregano e pimenta, ela tinha tempo de simplesmente NÃO pensar, e NÃO pensar, era tudo que ela precisava para acalmar sua conturbada mente.

A conversa interna se iniciou como em todo processo meditativo:

[Josephine] - Qual a validade desse pão ... ? Eita, falta 1 dia só.
[Mente] - Vc pagou a conta de luz?
[Josephine] - Droga, que dia é hoje mesmo? Merda, a conta de luz tá vencida.
[Josephine] - Melhor lavar esse queijo ...
[Mente] - E se aquilo tudo era mentira? Convenhamos, pode ser mentira.
[Josephine] - Vou colocar mais, tô com mais fome hoje. Opa, tenho que me pesar antes desse lanche. E antes do copão de suco de caju.
[Mente] - Se engordar de novo, vai ser foda. Quantos gramas devem aumentar um sanduíche?
[Josephine] - Cala a boca, e me deixa só preparar meu sanduba e comer. Fica quieta. Eu não sou você e nós não somos Eu. Entendeu né. Shiii! Silêncio!



Ela sempre soube que a melhor forma de encontrar suas respostas era olhar pra si e criar um isolamento de si mesma, da mente, do eu e de todo o resto. Dessa forma ela se unia a um TODO, aos mosquitos, a terra, a árvore e a flor. Não ser nada, lhe dava a paz de se sentir partir de tudo, do todo.

Lá fora, os infectados. E não havia forma de distinguir uns dos outros. Partir, significava ir rumo ao desconhecido e estar sujeita a toda sorte de acontecimentos. Estar sujeita a toda sorte de mudança de planos e rumos de vida. Ficar era estar sujeita a não alcançar seus sonhos, estar sujeita a permanecer exatamente do jeito que está. E isso a aterrorizava.

Sanduíche pronto. Suco de caju para uma memória afetiva e infantil. TV ligada. Mesa arrumada. Mente após esporro.

Ela adormece após o lanche e sonha que tomou a melhor decisão. E tomou. É preciso sobreviver, e acreditar na melhor decisão é sempre uma forma de ir em frente.

Lá fora, raios e trovões. E mais decisões a serem tomadas.

Ass. Amigo de Josephine